A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou cabível uma ação de depósito movida pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para recuperar mais de 1,8 mil toneladas de arroz, adquiridos em contratos de AGF (Aquisições do Governo Federal) e entregues aos produtores para armazenamento.
Para os ministros, a ação de depósito é válida no caso analisado, já que a Conab adquiriu os grãos como política pública destinada a garantir preços mínimos de mercado, cabendo aos cerealistas apenas a sua guarda.
Ao constatar o desvio do produto, a Conab ingressou com ação de depósito para garantir a devolução. Por força de liminar de busca e apreensão, a maior parte foi recolhida, restando 320 toneladas como saldo remanescente.
Ação procedente
A sentença, mantida em segundo grau, condenou os cerealistas à devolução das sacas, julgando pela procedência da ação de depósito, mesmo se tratando de bens fungíveis. No caso de impossibilidade da devolução do produto, a restituição deveria ser feita em dinheiro.
Os cerealistas alegaram não ter recebido o valor contratado pelo armazenamento e que por isso dispuseram do produto. Em recurso ao STJ, sustentaram que a ação de depósito não seria cabível em relação a bens fungíveis, como no caso.
O relator do caso, ministro Raul Araújo, destacou que “o contrato firmado com a Conab destina-se à guarda e conservação do produto decorrente de AGF e, portanto, está completamente desvinculado dos contratos originalmente firmados entre o Banco do Brasil e os produtores”.
Contrato típico
Para o ministro, os cerealistas não têm razão em contestar a ação promovida pela Conab, já que o arroz foi adquirido pelo governo federal e apenas armazenado por eles, algo explicitado no contrato firmado entre as partes.
Ele disse que a Conab, na falta de armazéns próprios, costuma contratar a estocagem com os próprios produtores. Conforme registrado pela sentença, nesses casos o produtor armazena bens de terceiro, não mais dispondo de poderes para aliená-lo.
“Forçoso reconhecer que, na hipótese, cuida-se de contrato de depósito típico, por meio do qual se estipulou a guarda e conservação dos bens já alienados à depositante, inexistindo, por outro lado, qualquer vinculação deste a outro ajuste de mera garantia de dívida”, concluiu o ministro.
Prisão
O recurso dos cerealistas só foi provido para afastar a prisão civil, nos termos da Súmula Vinculante 25 do Supremo Tribunal Federal, que veda a prisão do depositário infiel em qualquer hipótese.
Quanto ao alegado direito de retenção do produto por falta de pagamento pela armazenagem, os argumentos dos recorrentes não foram aceitos pelas instâncias ordinárias, e a Quarta Turma considerou que não poderia rever esse aspecto em recurso especial, por envolver matéria de prova.