Por maioria de votos, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que cabe ao tribunal arbitral decidir conflito envolvendo a Agência Nacional de Petróleo (ANP) e a Petrobras no Espírito Santo.
Trata-se do primeiro julgado acerca da aplicação da arbitragem no âmbito da administração pública.
O caso envolve a cobrança pela ANP de uma participação especial devida pela Petrobras em razão da exploração de campos de petróleo e gás no litoral capixaba. Após 16 anos de vigência do contrato, a ANP proferiu decisão administrativa que unificou todos os campos anteriormente arrematados, criando um único grande campo de petróleo (Campo de Jubarte) e, consequentemente, gerando o pagamento dessa participação especial.
A Petrobras recorreu à Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (CCI) e, após a instalação do procedimento arbitral, entrou com ação judicial para afastar a cobrança. O pedido foi deferido em primeira instância, mas a liminar foi cassada pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2).
A discussão
A Petrobras, então, suscitou conflito de competência no STJ, com pedido de liminar para suspensão da resolução da ANP até o julgamento do mérito do conflito. O pedido foi deferido pelo relator, ministro Napoleão Nunes Maia Filho.
No julgamento de mérito, no entanto, o relator reconheceu a competência da Justiça Federal para julgar o conflito. Ele considerou que a resolução da ANP tratava de direito patrimonial indisponível – portanto, não apreciável em arbitragem – e também que não se poderia impor ao Estado do Espírito Santo, não signatário da cláusula compromissória do contrato de concessão, algum efeito de decisão de corte arbitral.
Voto vencedor
A ministra Regina Helena Costa divergiu desse entendimento. Ela destacou os artigos 8º e 20 da Lei 9.307/96, que conferem ao juízo arbitral a faculdade de deliberar sobre os limites de suas atribuições, precedentemente a qualquer outro órgão julgador, bem como sobre as questões relativas à existência, à validade e à eficácia da convenção de arbitragem e do próprio contrato que contenha a cláusula compromissória.
Em relação à indisponibilidade do direito patrimonial, a ministra reconheceu que o interesse público é sempre indisponível por ser de titularidade da coletividade, mas observou que os direitos patrimoniais podem ser disponíveis ou indisponíveis.
“Sempre que a administração contrata, há disponibilidade do direito patrimonial, podendo, desse modo, ser objeto de cláusula arbitral, sem que isso importe em disponibilidade do interesse público”, disse.
Quanto à possibilidade de o Estado do Espírito Santo, alheio ao contrato, sofrer os efeitos da decisão, a ministra destacou que a arbitragem não impossibilita o acesso à Justiça pelo Estado-membro.
“Considerando a evolução da natureza contratual para jurisdicional da atividade da arbitragem e o afastamento da jurisdição estatal, é possível a intervenção do Estado do Espírito Santo, na qualidade de terceiro interessado decorrente da alegada alteração dos critérios de distribuição de royalties”, explicou.
Para Regina Helena Costa, a abertura prematura da instância judicial frustra “o propósito maior do instituto da arbitragem, de meio de solução dos conflitos alternativo e precedente à discussão judicial, nesta nova era pontuada por múltiplos instrumentos de busca de pacificação social”.
Leia o acórdão.