A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso em habeas corpus para reformar decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, reconhecer a inépcia da denúncia e trancar a ação penal em relação a três dos quatro réus acusados de homicídio culposo em coautoria. Para o colegiado, a denúncia não trouxe indicativo mínimo de vínculo subjetivo entre os denunciados, prejudicando a ampla defesa.
Segundo o processo, um trabalhador estava sendo içado com uma comporta quando, devido ao excesso de peso, o cabo do guincho se rompeu, provocando a queda fatal de aproximadamente 40 metros.
Além do filho da vítima, que manejava o guincho na hora do acidente, foram denunciadas outras três pessoas responsáveis pela obra pública que era realizada na cidade de Caxias do Sul (RS). Em recurso ao STJ, um desses três corréus alegou que a denúncia foi inepta e carente de justa causa, uma vez que não descreveu o dever objetivo de cuidado que não teria sido observado, não narrou o nexo de causalidade nem indicou o que deveria ter sido feito para impedir o resultado.
Concurso de agentes
O relator na Quinta Turma, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, observou que ao filho da vítima é atribuída a conduta de içar a comporta de forma imperita, “portanto há uma ação culposa”, e, quanto a ele, à primeira vista, está presente a justa causa para a ação penal.
No entanto, em relação aos denunciados que figuram no processo como coautores, o ministro assinalou que são requisitos indispensáveis ao concurso de agentes a pluralidade de agentes e de condutas, a relevância causal de cada conduta, o liame subjetivo entre os agentes e a identidade de infração.
Segundo ele, no caso concreto não se verificou liame subjetivo, razão pela qual “não há falar em concurso de agentes, devendo cada um responder pela sua própria ação ou omissão. Ademais, só pode ser considerado coautor aquele que tem participação importante e necessária ao cometimento da infração”.
Para o ministro, não é possível, “a não ser de forma reflexa”, atribuir aos demais denunciados a imperícia imputada ao filho ao içar a comporta com sobrepeso, “pois nem ao menos é possível concluir que sua conduta tenha entrado na esfera de conhecimento dos demais”.
Inépcia
De acordo com Reynaldo Soares da Fonseca, além da não colaboração entre as partes para o resultado fatal, a imputação revelou responsabilidade penal objetiva que não é admitida no ordenamento jurídico brasileiro.
“Não tendo a inicial narrado o liame subjetivo entre os demais denunciados e o autor da conduta imperita que ocasionou a morte da vítima, e não se verificando a relevância causal da negligência imputada, tem-se que a denúncia não apresenta todos os elementos necessários à imputação do crime em coautoria. A acusação não se desincumbiu de delinear de forma adequada a coautoria no crime culposo, o que revela a inépcia da denúncia, vício que prejudica o exercício da ampla defesa”, destacou.
Ao lembrar que o trancamento da ação penal somente é possível em caráter excepcional, o ministro estendeu os efeitos da decisão, tomada por unanimidade pela turma, aos outros dois denunciados, nos termos do artigo 580 do Código de Processo Penal.