A sucessão deve ser regida pelas regras vigentes no momento do falecimento do autor da herança, ainda que isso tenha ocorrido quando não mais se admitia a distinção entre filhos adotivos e consanguíneos e que antes tenha havido ato jurídico perfeito de adoção simples realizada durante a vigência do Código Civil de 1916, que estabelecia regime diferenciado de sucessão entre os filhos adotivos e os consanguíneos.
Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que assegurou a um homem o direito de participar da sucessão de sua irmã adotiva em concorrência com os irmãos consanguíneos dela.
Ambos foram adotados de forma simples e por escritura pública em 1947, na vigência do CC de 1916 e sem todos os direitos de sucessão. Em 2012, após o falecimento de sua irmã, o homem ingressou com ação para participar da sucessão, pleito que foi rejeitado em primeira instância. Ao julgar recurso, o TJMG garantiu o direito afirmando que, apesar do ato jurídico perfeito da adoção simples, a abertura da sucessão somente ocorreu em 2012, época em que a matéria já era regida pelo artigo 227 da Constituição de 1988 e pelo artigo 1.596 do CC de 2002.
Conceitos desvinculados
Segundo a relatora do recurso especial, ministra Nancy Andrighi, a conclusão do tribunal estadual foi acertada, pois, ao contrário do que sustentaram os recorrentes (irmãos consanguíneos da falecida), não há no caso violação a ato jurídico perfeito de adoção simples anteriormente realizado, e o direito adquirido ao regime sucessório apenas se materializou com o falecimento da autora da herança, ocorrido em 2012.
“É preciso desvincular o conceito de ato jurídico perfeito da ideia de direito adquirido, pois, embora um determinado ato jurídico possa gerar direitos subjetivos a um determinado titular – que seriam invioláveis por legislação superveniente, não em virtude do ato jurídico perfeito, mas da proteção ao direito adquirido –, essa não é uma consequência óbvia ou indispensável da consumação, havendo atos jurídicos aptos a gerar mera expectativa de direito”, explicou a relatora, ao justificar por que a pretensão dos irmãos consanguíneos da falecida não poderia subsistir.
Direitos distintos
“O ato jurídico perfeito de adoção não é capaz de conferir às partes também o direito ao regime sucessório então vigente. Trata-se, pois, de mera expectativa de direito, condicionada à abertura da sucessão durante a vigência do CC/1916, suficiente para, aplicando-se as regras de direito intertemporal, adequadamente isolar os institutos jurídicos que possuem natureza diversa”, disse.
Nancy Andrighi lembrou que o ato de adoção permanece perfeito, pois o direito de filiação é distinto do sucessório, sendo que este é regido pela lei vigente ao momento da abertura da sucessão.
“Em suma, havendo regra jurídica nova – de índole legal ou constitucional – alterando o regime sucessório, deverá ela ser aplicada às sucessões que forem abertas após a entrada em vigor do novo diploma legal, não havendo que se falar em violação a ato jurídico perfeito que lhe seja antecedente se este não conferiu às partes direito adquirido”, concluiu a ministra.
Leia o acórdão.