Conceder abatimento no valor da mensalidade escolar para quem paga dentro do prazo, o chamado “desconto pontualidade”, não é prática abusiva, segundo decisão unânime da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O desconto foi considerado um “indiscutível benefício” pelos ministros que integram o colegiado do STJ, especializado em direito privado, durante julgamento que reformou decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).
O caso envolve ação civil pública movida pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP) contra uma instituição privada de ensino cujos contratos preveem a concessão de “desconto pontualidade” aos alunos que pagam em dia.
Fictício
Para o MPSP, trata-se de um “desconto fictício”, já que, no valor nominal da mensalidade, “estaria embutido o valor de uma multa moratória camuflada”. O MPSP considerou que o desconto, na verdade, seria um artifício para burlar o limite de 2% para a multa por atraso, previsto no parágrafo 1º do artigo 52 do Código de Defesa do Consumidor.
Com a decisão desfavorável no TJSP, que aceitou os argumentos do Ministério Público, a instituição de ensino recorreu ao STJ, cabendo a relatoria do caso ao ministro Marco Aurélio Bellizze.
Em seu voto, o ministro ressaltou que o abono por pontualidade e a multa contratual têm em comum o objetivo de induzir o cumprimento da obrigação ajustada, mas são essencialmente diferentes.
Coexistência
Para o relator, a multa tem um “viés coercitivo e punitivo, na medida em que as partes, segundo o princípio da autonomia privada, convencionam a imposição de uma penalidade na hipótese de descumprimento da obrigação”.
Já o desconto, explicou, “ainda que destinado a instar a outra parte contratante a adimplir a sua obrigação, constitui um idôneo instrumento posto à disposição das partes, também com esteio na autonomia privada, destinado a encorajar, incentivar o contratante a realizar um comportamento positivo, almejado pelas partes e pela sociedade, premiando-o”.
De acordo com Bellizze, é “absolutamente possível a coexistência de sanções negativas, consistentes em consequências gravosas e/ou punitivas decorrentes do descumprimento da obrigação, com a estipulação de meios aptos a facilitar o adimplemento, ou mesmo de vantagens (sanções positivas) ao contratante que, ao tempo e modo ajustado, cumprir com o seu dever pactuado”.
Benefício efetivo
O relator afirmou que os serviços educacionais foram contratados “mediante o pagamento de um preço de anualidade certo, definido e aceito pelas partes, diluído em prestações nominais e taxa de matrícula”, e que em nenhum momento do processo se apontou eventual falta de informação ou vício de consentimento na contratação, especialmente em relação ao preço estipulado.
Assim, disse o ministro, “se o somatório dos valores nominais constantes das mensalidades (incluídos, aí, os valores de matrícula) equivale ao preço da anuidade contratada, ressai inquestionável que a concessão do denominado ‘desconto por pontualidade’ consubstancia idônea medida de estímulo à consecução do cumprimento do contrato, a premiar, legitimamente, o consumidor que efetuar o pagamento de sua mensalidade na data avençada”.
Bellizze considerou ainda que uma das variáveis que interferem na definição do valor da anuidade é justamente o nível de inadimplência, e que a proibição do desconto significaria dar tratamento igual a todos os alunos, prejudicando aqueles que pagam em dia, pois acabaria por levar a um redimensionamento dos custos da instituição de ensino.
Em vista disso, afirmou o ministro, o desconto de pontualidade significa “indiscutível benefício ao consumidor adimplente – que pagará por um valor efetivamente menor do preço da anuidade ajustado”.
Leia o acórdão.