Em decisão unânime, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou a liminar concedida em setembro pelo ministro Rogerio Schietti Cruz e concedeu habeas corpus para garantir ao catador de material reciclável Rafael Braga o direito de cumprir pena em regime domiciliar, por razões de saúde.
O réu foi condenado em primeira instância a 11 anos e três meses de prisão por portar 0,6 grama de maconha e 9,3 gramas de cocaína. O julgamento da apelação estava previsto para esta terça-feira (12) no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
De acordo com o ministro Schietti, relator do pedido de habeas corpus, eventual confirmação da sentença condenatória em segunda instância não prejudica o benefício da prisão domiciliar, que deve perdurar pelo tempo em que permanecerem “o agravado estado de saúde do paciente e as insalubres condições de acomodação do estabelecimento prisional”.
Condições insalubres
Rafael Braga já havia sido preso nas manifestações públicas de junho de 2013, acusado de portar material explosivo e uma garrafa de desinfetante, e foi condenado a cinco anos de prisão. Após a condenação pela Lei de Drogas e a notícia de que estava acometido de tuberculose, vivendo em péssimas condições sanitárias e sem tratamento adequado, sua situação desencadeou uma campanha em redes sociais.
Em seu voto, Rogerio Schietti destacou que, segundo o Ministério da Saúde, o risco de adoecimento por tuberculose é 28 vezes maior em grupos vulneráveis como as populações privadas de liberdade. Ele lembrou que o Supremo Tribunal Federal, ao analisar a situação dos presídios brasileiros, já a definiu como um “estado de coisas inconstitucional”, em razão da violação massiva e persistente dos direitos fundamentais.
“O quadro grotesco de violações aos direitos e às garantias fundamentais alcança distinto patamar em hipóteses que, como a de Rafael Braga Vieira, tratam de indivíduos que satisfazem o perfil corriqueiro dos encarcerados no país: negros, jovens, de baixa renda e escolaridade, os quais, dentro dos presídios, continuam a sofrer as agruras do desinteresse estatal em prover, com um mínimo de qualidade, os serviços públicos que, mesmo para os que estão privados de liberdade, não podem ser negados”, afirmou o ministro.
Superlotação
Antes da liminar concedida em setembro, lembrou Schietti, Braga se encontrava na Penitenciária Alfredo Tranjan, integrante do Complexo Penitenciário de Bangu, “destacada pela precariedade de suas instalações”.
Uma fiscalização do Núcleo de Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, realizada em fevereiro de 2017, revelou que a capacidade total do estabelecimento é de 881 internos. Entretanto, no dia da visita a unidade contava com 3.087 presos. Entre outros problemas verificados pela inspeção, segundo Schietti, havia muita sujeira, presença de ratos e insetos, espaços sufocantes e atendimento médico “completamente insuficiente”.
O habeas corpus foi concedido com fundamento no inciso II do artigo 318 do Código de Processo Penal. O relator esclareceu, entretanto, que “a providência ora determinada não implica reconhecimento de que toda e qualquer pessoa presa, enferma, em estabelecimento prisional neste país tenha direito à prisão domiciliar”.
Além das circunstâncias específicas relacionadas à doença de Rafael Braga, o ministro mencionou o fato de não haver nenhuma indicação de que, solto, ele representaria riscos à sociedade, o que autoriza “a escolha de providência de cunho humanitário, devidamente amparada em lei”.
Leia o voto do relator.