Durante o julgamento, na Corte Especial, de recursos contra a decisão que permitiu que a Prefeitura do Rio de Janeiro retomasse a administração da Linha Amarela, o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Humberto Martins, votou nesta quarta-feira (21) a favor da pretensão do município e contra os interesses da concessionária.
Um pedido de vista do ministro João Otávio de Noronha, ex-presidente do tribunal, interrompeu o julgamento, sustentando a complexidade da matéria e o fato de não ter atendido as partes do processo por dificuldades na agenda. O julgamento não tem data para ser retomado.
Segundo o ministro Humberto Martins, relator dos recursos, a prorrogação do contrato de concessão por longo período caracteriza uma espécie de monopólio privado, efetivado por meio de questionáveis aditivos em uma concessão que teve início em 1994.
"O contrato passaria dos dez anos iniciais, com término em 2004, para o prazo de 46 anos – quase meio século –, com início em 1994 e término em 2038; assim, incorreria em inafastável ofensa ao saneador princípio da concorrência e, consequentemente, ao princípio da isonomia, deslizando a concessão, de aditivo a aditivo, ao território do monopólio privado" – afirmou o ministro ao rejeitar os recursos.
Em seu voto, o presidente do STJ citou que o processo administrativo da controladoria-geral do município constatou diversas irregularidades na concessão – por exemplo, no cálculo para a fixação do pedágio e em obras que deveriam ser feitas na via.
"A Câmara Municipal do Rio de Janeiro, fundamentada nesse processo administrativo e no próprio conjunto de vivências dos membros que a compõem, aprovou, à unanimidade e com a quase integralidade dos vereadores (47 dos 51), a Lei Complementar Municipal 213/2019, que autorizou a encampação, em rara votação que uniu todos os partidos políticos daquela casa legislativa", comentou Martins.
Nos recursos dirigidos à Corte Especial, a Linha Amarela S.A. (Lamsa) e a Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias alegaram a ilegalidade da encampação e sustentaram que o pedido do município seria apenas a reiteração de outro feito anteriormente e negado.
De acordo com o ministro Humberto Martins, os argumentos formulados com base na segurança contratual e jurídica não podem legitimar uma situação irregular no controle da Linha Amarela.
"A relação entre o público e o privado, seja nas parcerias, seja nas concessões, materializa um fantástico instrumento de concretização da nossa infraestrutura, apto em si para fomentar a construção de um novo Brasil. O Judiciário tem plena consciência dessa realidade. Daí porque não pode aceitar quem provoca, em seus excessos, a verdadeira insegurança jurídica", concluiu.
Segundo ele, essa relação público-privado requer razoabilidade, transparência e equilíbrio para viabilizar contratos de longa duração.
"Um contrato que quebra as regras do edital, perpetuando-se no tempo; um contrato onde foi retirado todo o risco à empresa concessionária; um contrato onde a empresa se recusa a prestar contas; um contrato de inacreditável Taxa Interna de Retorno, esse contrato, sim, representa ameaça à segurança contratual."
Em seu voto, o ministro Humberto Martins também destacou que o Supremo Tribunal Federal (STF), em decisões proferidas pelos ministros Dias Toffoli, em 7 de julho deste ano, e Luiz Fux, em 6 de outubro, reconheceu a índole infraconstitucional do ato administrativo de encampação, definindo que o órgão que dispõe de competência para conhecer do pedido de suspensão de segurança é a Presidência do STJ.
Assim, o ministro afirmou que os agravos regimentais em exame suscitaram duas linhas de argumentação, incompatíveis entre si: a existência de decisão de mérito, em suspensão de segurança, emanada da Presidência do STJ e emanada da Presidência do STF, deslembrando que, no âmbito do instituto de suspensão de liminar, uma competência exclui a outra.
"Essas alegações (de reiteração de pedidos) não correspondem ao que simplesmente aconteceu. Não houve conhecimento da matéria, nem pela Presidência do STJ, nem pela Presidência do STF", afirmou Martins.