Em um momento de múltiplos desafios provocados pela pandemia da Covid-19, a realização de sessões de julgamento por videoconferência representa a melhor experiência que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) viveu nos últimos tempos, confirmando a importância da modernização tecnológica dos tribunais e abrindo a oportunidade para a construção de novos modelos de prestação da justiça.
A afirmação foi feita pelo presidente da corte, ministro João Otávio de Noronha, ao proferir palestra na conferência magna que encerrou o I Congresso Digital Covid-19: Repercussões Jurídicas e Sociais da Pandemia, promovido pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Sob o tema Garantias para o Exercício da Advocacia no Mundo Digital: Audiências e Julgamentos Virtuais – Vantagens e Desvantagens, o ministro Noronha destacou que a tecnologia da informação tem propiciado o pleno funcionamento não só do Judiciário, mas da advocacia e das demais instituições brasileiras, como o Congresso Nacional.
Entretanto, o ministro chamou a atenção para a necessidade de ampliação dos investimentos tecnológicos no sistema de Justiça e a importância de fomento à inclusão digital, para alcançar inclusive os advogados que atuam "nos mais distantes rincões".
"É preciso que os investimentos continuem, mesmo porque os aprendizados desse momento vão permanecer", afirmou Noronha.
No âmbito do STJ, o ministro apresentou a distinção entre as sessões de julgamento virtuais – com duração de sete dias e destinadas ao julgamento de recursos internos – e as sessões por videoconferência, que têm conseguido estabelecer uma dinâmica muito semelhante à dos julgamentos presenciais, com respeito às garantias das partes e dos advogados.
Em relação às sessões virtuais, contudo, o ministro defendeu a necessidade de aprimoramento do sistema de julgamento, com a adoção de um modelo mais simples de acesso aos votos e às decisões dos colegiados.
Por outro lado, apesar da eficácia das sessões por videoconferência, Noronha ponderou a necessidade de se estabelecerem alguns limites, como a restrição ao envio de sustentações orais gravadas. O ministro também lembrou que a possibilidade da defesa oral a distância pelos advogados pode gerar um grande número de inscrições para sustentação, comprometendo o rendimento das sessões.
Mesmo assim, o presidente do STJ acredita que, no futuro próximo, haverá uma espécie de "modelo híbrido de sessões de julgamento" – com a continuidade das sessões presenciais, mas com a opção da realização de reuniões por videoconferência.
Em sua palestra, o ministro Noronha também defendeu a necessidade de qualificação dos advogados que pretendem atuar nas cortes superiores, já que esses tribunais são responsáveis pela fixação de teses e pela formação de precedentes que impactam profundamente a sociedade brasileira.
"A jurisprudência mal formulada em um tribunal superior pode ser danosa ao ambiente econômico, social, trabalhista e familiar", afirmou.
Além disso, o ministro apontou que é preciso garantir a independência dos magistrados, os quais, na tomada de decisões, não podem estar sujeitos a interferências políticas, pressões sociais ou informações da imprensa. "O juiz só é refém da Constituição", declarou.
O Congresso Digital Covid-19 foi realizado pela OAB entre os dias 27 e 31 de julho. O evento reuniu uma série de especialistas em 148 painéis, 17 conferências magnas e 466 palestras nacionais e internacionais.
Entre os diversos temas discutidos, estão o impacto da Covid-19 nos mais variados campos do direito, as fake news durante a pandemia, o funcionamento do Judiciário, as eleições de 2020, o panorama da advocacia e o papel da sociedade civil no combate ao novo coronavírus.
Além de Noronha, o congresso teve a participação de outros ministros do STJ, que debateram os seguintes temas:
Humberto Martins – As Ações e o Funcionamento do Judiciário em Tempos de Pandemia
Napoleão Nunes Maia Filho – Os Atos da Administração e a Responsabilidade em Momentos de Pandemia
Jorge Mussi – As Repercussões da Pandemia no Direito Penal
Luis Felipe Salomão – O Futuro dos Direitos das Empresas
Mauro Campbell Marques – Contratação pelo Poder Público no Orçamento de Guerra
Benedito Gonçalves – Os Atos da Administração e a Responsabilidade em Momentos de Pandemia
Raul Araújo – O Agronegócio, as Relações Jurídicas e a Pandemia
Paulo de Tarso Sanseverino – O Direito de Transição em Tempos de Crise Pandêmica
Villas Bôas Cueva – Proteção de Dados e Autodeterminação Informativa
Sebastião Reis Júnior – Mudanças do Processo Penal do Pacote Anticrime em Meio à Pandemia
Marco Buzzi – O Papel do Advogado na Mediação e Conciliação em Tempos de Pandemia
Marco Aurélio Bellizze – Dever de Renegociar
Moura Ribeiro – Obrigações e Revisão dos Contratos na Pandemia
Rogerio Schietti Cruz – Pandemia, Crimes contra a Saúde e Sistema Carcerário
Gurgel de Faria – Segurança Jurídica e Tributação em Tempos de Pandemia
Reynaldo Soares da Fonseca – As Repercussões da Pandemia no Direito Penal
Ribeiro Dantas – O Direito de Transição em Tempos de Crise Pandêmica
Antonio Saldanha Palheiro – As Repercussões da Pandemia no Direito Penal