Por unanimidade, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) recebeu nesta quarta-feira (19) denúncia contra o ex-presidente do Tribunal de Contas do Amapá (TCE/AP) José Júlio de Miranda Coelho. O conselheiro é investigado pela suposta prática do crime de lavagem de dinheiro de forma reiterada, apurada na Operação Mãos Limpas.
Ao receber a denúncia, o colegiado também decidiu pelo afastamento do conselheiro de suas funções no TCE até o término do julgamento da ação penal. José Júlio Coelho já está afastado do cargo por decisão da própria corte em outro processo, a APn 702.
A Corte Especial proibiu o conselheiro de ingressar em qualquer dependência do TCE e de utilizar seus bens e serviços – excetuado o serviço de saúde –, ou de manter contato com as unidades e os funcionários da instituição.
De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), entre 2001 e 2010, o conselheiro teria elaborado plano para desviar mais de R$ 100 milhões do TCE, dinheiro usado para comprar vários imóveis em diversas cidades brasileiras, os quais foram ocultados em nome de outras pessoas e empresas.
Para o MPF, a evolução patrimonial do conselheiro desde 1998 é incompatível com a renda obtida em suas atividades lícitas.
Em resposta à acusação, a defesa de José Júlio Coelho questionou a validade das investigações, alegando que as medidas cautelares deferidas no processo teriam sido baseadas unicamente em carta anônima, o que, segundo a defesa, deveria atrair a incidência da teoria da nulidade por derivação a todas as demais provas obtidas na apuração (teoria dos frutos da árvore envenenada).
Relatora da ação penal, a ministra Nancy Andrighi lembrou que as investigações da Operação Mãos Limpas apuraram a formação de um grande esquema criminoso no Amapá, que envolveria autoridades de todas as esferas públicas do estado. Nesse complexo contexto, destacou a ministra, os fatos já investigados conduziram à apuração de condutas praticadas no TCE, que acabaram indicando a ocorrência de saques em espécie nas contas do tribunal, de responsabilidade de José Júlio Coelho.
"Foi, portanto, nesse intrincado conjunto de circunstâncias que se verificou o norteamento da investigação ao Tribunal de Contas do Estado do Amapá e a seus conselheiros, entre eles o acusado da presente ação penal, o que evidencia que o documento anônimo mencionado pela defesa não é o único e exclusivo suporte das provas obtidas em relação aos fatos que são imputados ao réu, sendo apenas mais um elemento a embasar o curso das investigações", disse a relatora.
De acordo com Nancy Andrighi, a denúncia do MPF descreveu, de forma concreta e satisfatória, a relação entre as condutas imputadas ao acusado e os supostos crimes antecedentes, detalhando a suposta utilização de pessoas jurídicas para a compra de imóveis com recursos públicos, desviados pelo conselheiro mediante peculato e ordenação ilegal de despesas, além de ter apresentado elementos indiciários mínimos aptos a demonstrar a existência de justa causa para a persecução penal.
A relatora enfatizou que, segundo o MPF, o conselheiro teria recebido procurações dos sócios das empresas para administrar o patrimônio colocado em nome delas.
Para a ministra, a denúncia demonstrou concretamente "como a conduta do denunciado estaria relacionada à suposta prática dos elementos nucleares do crime de lavagem de dinheiro (artigo 1º da Lei 9.613/1998), sobretudo pela ocultação e dissimulação da origem supostamente ilícita do patrimônio, por meio da atribuição de sua titularidade a terceiros – na hipótese, as pessoas jurídicas das empresas mencionadas na inicial –, o que atende à exigência de aptidão da peça acusatória e possibilita a ampla defesa do acusado".