Aconteceu nesta quarta-feira (4) o primeiro debate da terceira edição do Seminário Jurídico de Seguros. Promovido pela Revista Justiça & Cidadania, o encontro tem o apoio do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e foi transmitido ao vivo pelo YouTube.
O presidente do STJ, ministro Humberto Martins, enviou uma saudação por vídeo aos participantes do webinário. Segundo ele, o momento de dificuldades vivido pelo país exige a união de todos os brasileiros. Martins fez também uma homenagem ao ministro Luis Felipe Salomão, coordenador científico do evento.
"Os debates que aqui serão travados contribuirão para dar maior segurança jurídica aos diversos aspectos ligados à área securitária. Assim, a realização deste evento é de extrema relevância e representa a certeza de que o Poder Judiciário brasileiro está atento às questões que permeiam as atividades securitárias", afirmou.
No primeiro dia do seminário foram discutidas "Incapacidades no seguro de vida na visão do STJ". Participaram desse primeiro webinário os ministros João Otávio de Noronha e Paulo de Tarso Sanseverino; o presidente da Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg), Márcio Coriolano; o diretor jurídico do Grupo Zurich, Washington Luis da Silva; e o médico Roberto Albuquerque. A mediação foi feita pelo editor da Revista Justiça & Cidadania, Tiago Salles.
O ministro Paulo de Tarso Sanseverino falou sobre a evolução jurisprudencial do STJ em relação à cláusula de cobertura de incapacidade nos contratos de seguro de pessoas e a interpretação jurisprudencial acerca da validade e eficácia dessa cláusula.
Segundo o ministro, é muito comum a inclusão, no seguro de vida individual ou de grupo, de cláusula adicional de cobertura por Invalidez Funcional Permanente Total por Doença (IFPD) que condicione o pagamento da indenização à perda da existência independente do segurado, ou seja, à impossibilidade do exercício de suas atividades autônomas.
Sanseverino explicou que, em função das dificuldades de conceituação e das muitas dúvidas a respeito, em 2005, a Superintendência de Seguros Privados (Susep) editou a Resolução 302, vedando o oferecimento genérico de cobertura de IFPD.
O principal precedente envolvendo a matéria, afirmou o ministro, foi o REsp 1.449.513, de relatoria do ministro Villas Bôas Cueva. No caso, a Terceira Turma decidiu que a cobertura de invalidez funcional não tem vinculação com a de invalidez profissional, e que a seguradora deve sempre esclarecer previamente ao consumidor e ao estipulante – no seguro em grupo – sobre os produtos que oferece, prestando informações claras a respeito do tipo de cobertura contratada e das suas consequências.
O ministro informou que, como os processos acerca dessa questão continuam chegando em grande número, o STJ afetou dois recursos especiais para julgamento pelo rito dos repetitivos (Tema 1.068), objetivando "definir a legalidade da cláusula que prevê a cobertura adicional de IFPD em contrato de seguro de vida em grupo, condicionando o pagamento da indenização securitária à perda da existência independente do segurado".
Sobre a eficácia da cláusula, o ministro disse que ela deve ser destacada com clareza no contrato e que a seguradora deve prestar informações sobre a modalidade de cobertura pactuada e os seus efeitos.
"Há uma preocupação da jurisprudência do STJ com a matéria e uma tendência de consolidação mediante o julgamento de recursos repetitivos afetados à Segunda Seção, definindo as principais questões acerca da validade e eficácia da cláusula de cobertura adicional por invalidez total e permanente. Isso decorre da preocupação do STJ com o princípio da segurança jurídica, traduzido na palavra previsibilidade, fundamental na dinâmica das relações contratuais de massa em nossa sociedade", concluiu.
O ministro João Otávio de Noronha falou sobre a importância da segurança jurídica nos contratos de seguro. Segundo ele, o Brasil precisa de uma cultura mais avançada quando se trata da relação consumidor/empresas de seguros.
Noronha destacou que a segurança jurídica é fundamental no setor e passa pela observância do mutualismo, "o princípio fundamental do contrato de seguro". Para o ministro, duas situações são muito negativas para a mutualidade: a fraude e a utilização indevida do seguro.
De acordo com o magistrado, é preciso diferenciar o conceito de invalidez para o seguro privado e para a Previdência Social. "Por isso, é fundamental para atingir a segurança nas relações contratuais que as cláusulas dos contratos de seguro sempre informem que a aposentadoria por invalidez concedida pelo setor público não caracteriza por si só a invalidez no setor privado", observou.
Tal delimitação não visa prejudicar o consumidor, afirmou o ministro. Segundo ele, o objetivo é ter sempre em vista o fundamento mutualista – a espinha dorsal da sustentabilidade e solvência do setor de seguros.
"Não há saída para o crescimento do país se as regras previamente estabelecidas não forem rigorosamente observadas. Isso deve pautar também o comportamento dos juízes. A jurisprudência não pode ser aqui equitativa. Seguro não dá ensejo a julgamento por equidade, como de regra os contratos não dão. Os contratos devem ser cumpridos tal qual pactuados", destacou.
Márcio Coriolano, da CNseg, apresentou dados do setor e avaliou que os brasileiros ainda não compram muitos seguros. No entanto – afirmou –, durante a pandemia do novo coronavírus, o setor tem contribuído para viabilizar a retomada do crescimento econômico. "O objetivo do seminário é reduzir as assimetrias de informações entre o Judiciário e os agentes da cadeia de valor do setor de seguros", explicou.
O médico Roberto Alburquerque apresentou uma visão técnica a respeito de incapacidade, invalidez parcial e invalidez permanente. Segundo ele, o tema tem alta incidência de conflitos e demandas judiciais. "É muito bom constatar que o Judiciário tem verificado efetivamente a legalidade das coberturas. Em relação à cobertura da invalidez por doença, o mercado trabalha com critérios bem definidos. Os critérios de concessão dos benefícios estão claros. Buscou-se ampliar ao máximo os critérios médicos para contemplar as diversas situações clínicas de invalidez por doença", afirmou.
Para Washington Luis da Silva, a finalidade do seguro de pessoas é manter economicamente o segurado ou a sua família durante o tempo previsto no contrato. Segundo ele, é preciso ter clareza nos contratos e previsibilidade jurídica ao se discutir o tema, pois o assunto interessa tanto aos consumidores quanto às empresas.
"O setor de seguros deve caminhar no sentido de se tornar um pouco mais visível para a população, e é muito importante ter uma previsibilidade, não só para as decisões judiciais, mas também para os contratos, pois assim poderemos fazer a economia crescer", apontou.
O próximo encontro do seminário acontecerá no dia 11, das 11h às 12h30, e terá como tema "Rol de procedimentos da saúde suplementar". Participarão desse debate os ministros Luis Felipe Salomão e Moura Ribeiro; o professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro Gustavo Binenbojm, o médico Denizar Vianna e o procurador-geral da Agência Nacional de Saúde Suplementar, Daniel Junqueira de Souza Tostes.
No encerramento, em 18 de novembro, o tema do debate será "O impacto da repercussão geral do STF – RE 827.996/PR, Tema 1.011 – nas ações de seguro habitacional do Sistema Financeiro de Habitação". A transmissão começará às 10h30. Os debatedores serão os ministros Villas Bôas Cueva e Gurgel de Faria; o procurador-geral da Superintendência de Seguros Privados (Susep), Igor Lins da Rocha Lourenço, e o advogado Gustavo Fleichman.
O evento também conta com o apoio da CNseg, da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), da Escola Nacional da Magistratura (ENM), da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) e da Associação de Juízes Federais do Brasil (Ajufe).