Em julgamento de recursos especiais repetitivos (Tema 1.010), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, firmou o entendimento de que o Código Florestal (Lei 12.651/2012) deve ser aplicado para a delimitação da extensão da faixa não edificável a partir das margens de cursos d'água em áreas urbanas consolidadas.
Segundo o relator, ministro Benedito Gonçalves, a definição pela incidência do código leva em consideração a melhor e mais eficaz proteção ao meio ambiente, como dispõe o artigo 225 da Constituição Federal, observando o princípio do desenvolvimento sustentável (artigo 170, VI) e as funções social e ecológica da propriedade.
A tese fixada no julgamento foi a seguinte: "Na vigência do novo Código Florestal (Lei 12.651/2012), a extensão não edificável nas Áreas de Preservação Permanente (APPs) de qualquer curso d'água, perene ou intermitente, em trechos caracterizados como área urbana consolidada, deve respeitar o que disciplinado pelo seu artigo 4º, caput, inciso I, alíneas 'a', 'b', 'c', 'd' e 'e', a fim de assegurar a mais ampla garantia ambiental a esses espaços territoriais especialmente protegidos e, por conseguinte, à coletividade".
O ministro Benedito Gonçalves lembrou que, antes da entrada em vigor do novo Código Florestal, o STJ pacificou a compreensão de que as normas do antigo código é que deveriam disciplinar a largura mínima dessas faixas marginais em meio urbano (REsp 1.518.490).
"Deve-se, portanto, manter o entendimento desta Corte Superior de que não se pode tratar a disciplina das faixas marginais dos cursos d'água em áreas urbanas somente pela visão do direito urbanístico, enxergando cada urbis de forma isolada, pois as repercussões das intervenções antrópicas sobre essas áreas desbordam, quase sempre, do eixo local", observou.
Em seu voto, o relator considerou que o artigo 4º, caput, inciso I, do novo código – ao prever medidas mínimas superiores para as faixas marginais de qualquer curso d'água natural perene ou intermitente, sendo especial e específica para o caso diante do previsto no artigo 4º, III, da Lei do Parcelamento do Solo Urbano (Lei 6.766/1976) – deve reger a proteção das APPs ciliares ou ripárias em áreas urbanas consolidadas, espaços territoriais especialmente protegidos, que não se condicionam a fronteiras entre o meio rural e o urbano.
De acordo com o relator, tal entendimento não se altera pela superveniência da Lei 13.913/2019, que suprimiu a expressão "salvo maiores exigências da legislação específica" do inciso III do artigo 4º da Lei 6.766/1976.
Para o magistrado, pelo critério da especialidade, o artigo 4º do novo Código Florestal é o que garante a mais ampla proteção ao meio ambiente, em áreas urbana e rural, devendo, por isso, prevalecer.
O ministro acrescentou que a não aplicação da norma, que expressamente determina a incidência do novo Código Florestal também ao meio urbano, afronta o enunciado da Súmula Vinculante 10 do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual a decisão de órgão fracionário de tribunal que deixa de aplicar uma lei sem declarar sua inconstitucionalidade viola a cláusula de plenário.
"O fato de agora o inciso III-A do artigo 4º da Lei 6.766/1976 expressamente estabelecer, em caráter geral, a determinação do distanciamento de 'no mínimo' 15 metros apenas reforça a função de norma geral norteadora da menor distância que as faixas marginais, não edificáveis, devem manter dos cursos d'água, o que, por uma visão teleológica do sistema de proteção ambiental, não restringe a aplicação do artigo 4º, caput, da Lei 12.651/2012 às áreas urbanas consolidadas", afirmou Benedito Gonçalves.
Leia o acórdão no REsp 1.770.760.