A Terceira Seção consolidou o entendimento das turmas criminais do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao definir que a exigência de representação da vítima como pré-requisito para a ação penal por estelionato – introduzida pelo Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019) – não pode ser aplicada retroativamente para beneficiar o réu nos processos que já estavam em curso.
Com essa conclusão, o colegiado indeferiu pedido da Defensoria Pública de São Paulo para aplicar retroativamente a regra do parágrafo 5º do artigo 171 do Código Penal e reconhecer a extinção da punibilidade pela decadência em processo no qual um professor foi condenado por estelionato.
O Pacote Anticrime alterou a natureza jurídica da ação penal no delito de estelionato e passou a exigir a representação da vítima, como condição de procedibilidade, tornando-a, assim, ação pública condicionada à representação.
Para o ministro Ribeiro Dantas, relator do caso julgado na Terceira Seção, a nova norma não deve retroagir aos processos que estavam em curso quando do início da vigência do Pacote Anticrime. Ele lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF) já se manifestou no sentido de considerar inaplicável a retroatividade do dispositivo às hipóteses em que o Ministério Público tiver oferecido a denúncia antes da entrada em vigor da Lei 13.964/2019.
Segundo o magistrado, o STF entendeu que, anteriormente à nova lei, a norma processual em vigor definia a ação para o delito de estelionato como pública incondicionada, não exigindo qualquer condição de procedibilidade para a instauração da persecução penal em juízo.
Ribeiro Dantas mencionou também o primeiro precedente sobre o tema, de relatoria do ministro Reynaldo Soares da Fonseca, que, em junho do ano passado, concluiu pela irretroatividade da norma – posicionamento que se repetiu em outros julgados do tribunal.
O ministro ponderou ainda que a irretroatividade do parágrafo 5º do artigo 171 do Código Penal decorre da própria mens legis (finalidade da lei), pois o legislador previu apenas a condição de procedibilidade, nada dispondo – embora pudesse fazê-lo – sobre a condição de prosseguibilidade, isto é, condição necessária para o prosseguimento do processo.
Ribeiro Dantas ressaltou a necessidade de respeito aos princípios constitucionais do direito adquirido e do ato jurídico perfeito quando já oferecida a denúncia.
Além disso, o relator acrescentou que, na jurisprudência do STJ, a representação do ofendido não exige qualquer formalidade, sendo suficiente que a vítima leve o fato ao conhecimento das autoridades. Segundo o ministro, na quase totalidade dos processos, a persecução penal apenas começou em razão da manifestação da vítima.
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