A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, determinou que um recém-nascido seja devolvido à mãe, após o juiz de primeiro grau decretar que ele fosse encaminhado para casa de acolhimento. Segundo o colegiado, o deferimento da tutela de urgência para ordenar a busca e apreensão do bebê, anterior ao seu nascimento, foi prematuro e não observou os preceitos legais.
Na origem do caso, o Ministério Público de Santa Catarina ajuizou ação de destituição do poder familiar, cumulada com pedido de medida protetiva de acolhimento institucional, contra uma mulher grávida e a favor dos interesses do bebê ainda não nascido. Segundo o órgão ministerial, a gestante pretendia entregá-lo a uma prima e à sua companheira para adoção, sem respeitar a ordem dos candidatos registrados no cadastro de adotantes.
Foi deferida a tutela de urgência para determinar a busca e apreensão do bebê assim que nascesse, ainda no hospital, com a suspensão do poder familiar da mãe e a proibição de contato entre ela e a criança. A medida também concedeu, excepcionalmente, a guarda do recém-nascido ao primeiro casal habilitado na fila de adoção. Logo depois do parto, a criança foi encaminhada à instituição de acolhimento.
A mãe alega que, posteriormente a esses fatos, conseguiu emprego e decidiu cuidar do filho.
O relator do caso no STJ, ministro Marco Aurélio Bellizze, observou que, nos termos do artigo 19-A do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a mãe pode manifestar o desejo de entregar seu filho para adoção antes mesmo do parto, mas, nesse caso, ela deve ser encaminhada à Justiça da Infância e da Juventude para que seja ouvida por uma equipe profissional, a qual levará em conta eventuais efeitos do estado gestacional e puerperal.
Segundo o ministro, se é garantido à genitora o direito de manifestar sua intenção de entregar o filho à adoção, não se mostra aceitável que o Poder Judiciário, em tutela de urgência, em cognição sumária, determine a retirada abrupta do recém-nascido do acolhimento materno, nos momentos seguintes ao parto, mesmo que se considere a ilegalidade da pretensão de adoção intuitu personae (quando os genitores escolhem os adotantes, sem respeitar a fila de pretendentes cadastrados).
"Importante deixar assente que não houve nenhum ato concreto de prejuízo à saúde do menor, nem mesmo potencial, pois ainda que a entrega do recém-nascido à prima e à sua companheira tivesse ocorrido de forma irregular, dever-se-ia aguardar o nascimento e a sua efetiva ocorrência, tendo em vista a maternidade ser capaz de modificar os sentimentos de qualquer ser humano" afirmou o relator.
Bellizze destacou que caberia ao juízo cumprir a determinação legal e, primeiramente, encaminhar a mãe à equipe profissional para que fossem investigados os motivos de sua disposição de entregar o filho. Só depois disso é que poderiam ser tomadas outras medidas, em respeito aos princípios da proteção integral e do melhor interesse da criança.
O relator ressaltou que a criança tem o direito básico de ser criada em sua família natural –excepcionalmente, em família substituta. Para ele, a retirada extemporânea do bebê da guarda da mãe, inclusive com a proibição de contato entre ambos – decisão que considerou "ilegal e teratológica" –, inviabilizou por completo o cumprimento da norma segundo a qual devem ser tentados todos os meios possíveis para manter a criança em sua família natural (artigo 39, parágrafo 1º, do ECA).
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.