A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que a União tem responsabilidade solidária por omissão na tutela de patrimônio cultural cedido, mas função subsidiária na reparação de eventual dano. Para o colegiado, esse entendimento prioriza a obrigação de quem deu causa direta à má conservação do bem, sem deixar de oferecer mais de uma possibilidade para a reparação do direito difuso.
Na origem do caso, o Ministério Público Federal e o Ministério Público de Santa Catarina ajuizaram ação civil pública contra a União, o município de Criciúma (SC) e o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) para cobrar medidas de proteção e restauração do Centro Cultural Jorge Zanatta. O imóvel pertence à União e foi tombado em 2007 como patrimônio histórico e cultural do município catarinense, que detém a respectiva cessão de uso.
O juízo de primeiro grau e o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) entenderam que o município e a União devem responder solidariamente pela conservação do imóvel. Segundo a corte catarinense, o ente local tem a posse do espaço há 20 anos e foi responsável por sua deterioração. A União, por outro lado, não poderia se eximir da obrigação de fiscalizar o próprio bem que foi cedido por meio de convênio.
Em recurso especial, a União pediu que as suas atribuições, decorrentes de eventual manutenção da responsabilidade solidária, fossem executadas em caráter subsidiário (nesse caso, a reparação do bem cultural seria exigida, primeiramente, do município).
A ministra Assusete Magalhães, relatora do recurso na Segunda Turma do STJ, observou que o acórdão do TJSC definiu a responsabilidade solidária a partir de uma suposta semelhança do caso com processos em que se pede o fornecimento de medicamentos gratuitos por entes públicos. Nesses casos, a Justiça tem entendido que todos os entes federados devem cumprir a sentença de procedência do pedido, na medida de suas responsabilidades e possibilidades.
No entanto, a magistrada destacou que essa referência proposta pela corte estadual pode dificultar ou mesmo tornar inexequível a sentença condenatória.
"Tal diretriz remete o julgador, no cumprimento da sentença de fornecimento de medicamentos, às regras de repartição de competências definidas pelo SUS, o que não pode ter aplicação no presente caso, em que a obrigação solidária tem origem na cessão de uso de bem público", explicou a ministra.
De acordo com Assusete Magalhães, a solução da controvérsia passa por critérios definidos na Súmula 652 do STJ e já consolidados na jurisprudência da corte. Assim – prosseguiu a ministra –, em caso de omissão no dever de fiscalização, a responsabilidade civil ambiental solidária da administração pública é de execução subsidiária (ou com ordem de preferência).
Amparada pela doutrina, a relatora lembrou que a definição de patrimônio cultural se insere em um conceito amplo de meio ambiente, o que torna o entendimento sumular adequado ao caso em julgamento.
"Além de assegurar mais de uma via para a reparação do direito difuso" – concluiu Assusete Magalhães ao dar provimento ao recurso da União –, esse entendimento "chama à responsabilidade primária aquele que deu causa direta ao dano, evitando que a maior capacidade reparatória do ente fiscalizador acabe por isentar ou até mesmo estimular a conduta lesiva".