A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) retoma, nesta quarta-feira (15), o julgamento do Recurso Especial 1.795.982, que discute a possibilidade de aplicar a taxa Selic para a correção de dívidas civis, em vez do modelo de correção monetária somada aos juros de mora.
O ministro Raul Araújo, que pediu vista do processo na sessão do dia 1º deste mês, deve apresentar o seu voto. No início do julgamento, o relator, ministro Luis Felipe Salomão, votou contra a utilização da Selic na hipótese em debate.
Na ocasião, Salomão destacou que nenhuma das sete entidades que se manifestaram no processo na condição de amici curiae enfrentou o significado do termo "acumulado mensalmente" no caso dos juros.
O ministro fez uma análise dos dados da taxa Selic de 2002 a 2021, apontando, entre outros detalhes, que a soma dos acumulados mensais da taxa é menor que a soma dos acumulados anuais, e ambos são muito menores que a taxa Selic acumulada em 20 anos – esta última, a métrica utilizada para a correção de títulos da dívida pública, por exemplo.
"A soma dos 240 acumulados mensais da taxa Selic, de 2002 a 2021 (219,5%), é inferior à variação do IPCA no mesmo período (237,6%) – déficit de 18,09% –, de modo que a taxa Selic nem sequer recompôs a desvalorização da moeda verificada nesses 20 anos", fundamentou o ministro.
Salomão afirmou que a soma dos acumulados mensais resulta em percentuais menores, em comparação com o índice de variação entre o termo inicial e o termo final do período considerado, porque, ao final de cada mês, é interrompida a capitalização das taxas percentuais, o que interfere no método composto empregado.
O uso de acumulados mensais – tal como a regra de correção de débitos da Fazenda Pública – desvirtua o método composto do cálculo, e, de acordo com o relator, cria situações extremas nas quais os acumulados mensais nem cobrem a inflação e acarretam ausência de juros de mora.
O ministro afirmou que tal cenário configura a situação de juros negativos ou mora negativa apontada por alguns amici curiae, pois o valor final acaba sendo inferior à correção monetária.
"Ou seja, a adoção da taxa Selic para efeitos de pagamento – tanto de correção monetária quanto de juros moratórios – pode conduzir a situações paradoxais: por um lado, de enriquecimento sem causa, e, de outro, incentivo à litigância habitual, recalcitrância recursal e desmotivação para soluções alternativas de conflito, ciente o devedor que sua mora não acarretará grandes consequências patrimoniais", explicou.
Na visão do ministro, essa disfunção ocorre porque a Selic tem por objetivo o controle do consumo e, consequentemente, o combate a uma inflação futura em nível indesejado, "circunstância que guarda pouca relação com a natureza do pagamento de correção monetária e de juros, esses últimos definidos como a remuneração paga ao dono do capital pelo período em que fica privado do seu uso".
Luis Felipe Salomão afirmou que a adoção de acumulados mensais da Selic, em detrimento da multiplicação dos fatores diários – como no caso do pagamento de títulos da dívida pública –, acaba servindo de desestímulo para que o devedor civil faça o pagamento.
Essa conclusão, segundo o relator, decorre da natureza distinta dos juros moratórios em relação aos remuneratórios.
"Ao contrário dos juros remuneratórios, os juros moratórios possuem natureza punitiva, servindo, pois, de estímulo para o devedor cumprir a obrigação e não sofrer os efeitos da mora", concluiu.