A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, declarou a nulidade das provas usadas para condenar um homem acusado de tráfico de drogas. Para o colegiado, diante do confronto de versões sobre o que aconteceu na abordagem do suspeito, cabia ao Ministério Público o ônus de apresentar provas que corroborassem a versão dos policiais. Como os agentes não usavam câmeras corporais, a Sexta Turma concluiu que foi uma opção do Estado não se aparelhar devidamente para a produção de provas.
O caso diz respeito à abordagem de um homem pela Polícia Militar de São Paulo em via pública. Os policiais disseram que estavam em patrulhamento quando o acusado, ao avistá-los, fugiu e tentou se desfazer da sacola que carregava, jogando-a no terreno da casa vizinha à sua. Na sacola teriam sido encontrados 62 pinos com cocaína.
De acordo com a defesa, porém, o homem foi abordado pela polícia e, apesar de nada ter sido encontrado com ele, passou a ser agredido, por causa de seu histórico criminal, motivo pelo qual tentou fugir. A defesa sustentou que a droga encontrada na sacola não pertencia ao acusado e, além disso, teria sido apreendida pela polícia de maneira ilegal, mediante invasão do imóvel vizinho sem mandado judicial. O réu acabou condenado nas instâncias ordinárias.
No STJ, o Ministério Público de São Paulo sustentou que a fuga repentina diante da aproximação da polícia e o descarte da sacola levantaram suspeita e justificaram a ação dos policiais, devendo ser reconhecida a legalidade das provas obtidas na abordagem e mantida a condenação.
De acordo com o relator do caso na Sexta Turma, ministro Sebastião Reis Junior, a jurisprudência do tribunal exige que a busca pessoal seja amparada em uma fundada suspeita de que o indivíduo esteja na posse de drogas ou outra coisa ilegal. A busca residencial sem mandado judicial, por sua vez, exige elementos prévios que indiquem que esteja acontecendo um crime no interior do imóvel (HC 815.881).
De acordo com o relator, a polícia tentou justificar a abordagem pessoal apenas pelo aparente nervosismo do cidadão, demonstrado com a tentativa de fuga. No entanto, conforme entendimento anterior da Sexta Turma (HC 852.356), não há justa causa na abordagem decorrente de mera impressão subjetiva dos policiais.
Sebastião Reis Junior destacou que, diante da contraposição de versões, caberia ao Ministério Público provar as circunstâncias que autorizaram a busca. Como houve dúvidas entre as versões e não foram apresentadas provas que confirmassem as declarações dos policiais, o ministro entendeu não existir justa causa para a busca pessoal e declarou nulas as provas obtidas.
Para o relator, a exigência de outras provas que não apenas o depoimento dos policiais decorre não só da necessidade de provas irrefutáveis para a condenação, mas também do fato de que, hoje, tais provas poderiam ser produzidas sem maiores dificuldades.
"Tenho dito com frequência que situações como esta, em que há conflito de narrativas, poderiam ser solucionadas caso a polícia utilizasse meios modernos de controle de sua atividade, como as câmeras. Se registrada a abordagem, bem como seus momentos anteriores, não teríamos dúvida se os fatos ocorreram de acordo com o que foi descrito pelos policiais ou de acordo com o que foi narrado pelo recorrente", concluiu. "Fica evidente que o Estado optou por não se aparelhar de forma suficiente para produzir as provas necessárias", acrescentou o ministro.