Simpósio internacional discute mudanças climáticas, água e floresta sob perspectivas científica e jurídica
23/08/2024 18:55
 
 
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O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Herman Benjamin, participou da abertura do simpósio internacional Mudanças Climáticas, Água e Floresta, que aconteceu nesta sexta-feira (23) no Palácio Itamaraty, em Brasília, com transmissão ao vivo pelos canais da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) no YouTube.​​​​​​​​​

O ministro Herman Benjamin, presidente do STJ, fala na abertura do evento.
Iniciativa conjunta do STJ, do Ministério das Relações Exteriores e do Senado Federal, o simpósio foi convocado para discutir, sob as perspectivas científica e jurídica, o estado da arte e as interações recíprocas existentes entre as três faces de um mesmo universo: as mudanças climáticas, as águas e as florestas. As discussões incluíram tópicos como aspectos jurídicos relacionados ao desmatamento e às mudanças climáticas e o papel das instituições públicas e privadas nesse contexto.

Na abertura, Herman Benjamin afirmou que o tema do simpósio envolve três elementos indissociáveis, pois não é possível tratar de um sem abordar os outros dois. Para o ministro, o cuidado com rios e florestas no contexto das mudanças climáticas não se limita ao aspecto ambiental, mas representa uma questão estratégica, considerando que boa parte da energia consumida no Brasil vem da hidreletricidade. O ministro ponderou ainda as implicações sociais e econômicas do desequilíbrio ambiental, para as quais o Poder Judiciário tem dedicado cada vez mais atenção, tanto em seus julgados como em iniciativas para fortalecer diálogos interinstitucionais.

"Precisamos conectar as mudanças climáticas ao abastecimento de água e eletricidade, mas também a todo os outros ecossistemas que as florestas integram e oferecem", declarou Benjamin.

Controlar a mudança no clima exige transformação de matriz energética em escala global

Integrante da mesa na sessão de abertura, o embaixador extraordinário para a Mudança do Clima e ex-ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo, lembrou que, no início dos anos 1990, as discussões sobre meio ambiente tinham como foco a mitigação das emissões de gases de efeito estufa, ao passo que hoje se entende que as mudanças no clima não serão controladas sem uma transformação da matriz energética em escala global.

Já o presidente da Suprema Corte da Indonésia, ministro Muhammad Syarifuddin, afirmou que a mudança climática representa um perigo evidente para a natureza e para o planeta. O magistrado falou também sobre o impacto do diálogo comparativo entre as cortes supremas de todo o mundo, facilitado pelo Instituto Judicial Global. Embora a Indonésia não reconheça expressamente o princípio in dubio pro natura, disse ele, em decorrência do diálogo comparado, a experiência brasileira foi incorporada pela suprema corte do país nos seus precedentes.

O embaixador José Carlos Fonseca Junior, presidente-executivo da Associação Brasileira de Embalagens de Papel (Empapel) e diretor institucional da Indústria Brasileira de Árvores (Ibá), afirmou que a iniciativa privada tem o compromisso de preservar o meio ambiente ao mesmo tempo em que produz. Como exemplo, o embaixador citou os "mosaicos florestais", que intercalam plantio industrial com espécies nativas, e a adoção da atividade de restauro ambiental de áreas degradadas.

A ex-senadora Vanessa Grazziotin, diretora-executiva da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), destacou a dimensão humanitária das mudanças climáticas e das discussões relacionadas a águas e florestas. Ela comentou que as pessoas que mais sofrem os impactos climáticos são aquelas que menos contribuíram para sua ocorrência, como os povos indígenas, ribeirinhos e quilombolas. "A exclusão social dá oportunidade para que criminosos cooptem a mão de obra precarizada e vulnerável dessas populações, que não têm perspectiva de presente nem de futuro", disse a representante da OTCA.

Vanessa Mateus, juíza de direito e coordenadora da Justiça estadual na AMB, apresentou uma pesquisa da entidade sobre crimes ambientais na Amazônia Legal. Os resultados revelam que a criminalidade ambiental na região é complexa, revestida de alta sofisticação em toda a cadeia de atuação, e lança mão do recrutamento de pessoas simples para sua consecução.

A magistrada acredita que, para elucidar essa relação complexa, deve-se, além de investigar o fluxo financeiro atrelado a esses crimes, investir na especialização das pessoas que atuam nas varas ambientais. "A alta rotatividade nas comarcas longínquas dificulta o aprofundamento das investigações", concluiu.

Panorama científico das mudanças climáticas e suas conexões com florestas e água

O primeiro painel da manhã foi presidido pela professora da Faculdade de Direito da Universidade do Havaí, Denise Antolini, e teve apresentações de Carlos Nobre, pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo e membro do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC), e do professor da Universidade de Brasília e ex-secretário-executivo da Convenção da Biodiversidade, Bráulio Dias.

Carlos Nobre disse que, devido às mudanças climáticas, três dos maiores biomas brasileiros estão próximos do chamado "ponto de não retorno" climático, a partir do qual as mudanças se tornam irreversíveis. O pesquisador avaliou que, desde 2022, houve reduções do desmatamento, mas, paradoxalmente, aumento de áreas degradadas e de focos de incêndio. Segundo Nobre, a reversibilidade da situação atual pode estar pautada em soluções baseadas na natureza, como a implementação de "arcos de restauração" – processo de restauração em escala – e de sistemas de produção com alto potencial econômico, como o agroflorestal.

O professor Bráulio Dias apontou o risco de perda da biodiversidade e suas implicações. Ele explicou que o Brasil é o país mais biodiverso, mas com mais espécies ameaçadas de extinção em todo o mundo. Conforme esclareceu, a perda dessa biodiversidade pode ocasionar riscos à economia, à segurança alimentar e à saúde da população global. "Já temos boas soluções jurídicas e científicas, mas é preciso colocá-las em prática", opinou.

Panorama jurídico das mudanças climáticas e suas conexões com florestas e água

Presidido pelo juiz federal Caio Castagine Marinho, presidente da Ajufe, o segundo painel contou com a presença da professora da Universidade de Oslo e presidente da Comissão Mundial de Direito Ambiental da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), Christina Voigt, e da subprocuradora-geral da República e coordenadora da Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Histórico e Cultural do Ministério Público Federal, Luiza Cristina Fonseca Frischeisen.

Christina Voigt destacou os marcos jurídicos relacionados ao enfrentamento das mudanças climáticas, consideradas "sem precedentes" no que diz respeito às consequências biofísicas dos eventos climáticos. Segundo ela, a esfera legal internacional já reconhece o papel das florestas como abrigo da biodiversidade, como fontes de subsistência das comunidades tradicionais e como fontes de captura de carbono. A professora apontou a importância das convenções internacionais para o estabelecimento de objetivos comuns de redução das emissões de gases de efeito estufa, cujos documentos finais têm representado "não apenas uma declaração política, mas também uma obrigação legal a ser cumprida".

Para Luiza Frischeisen, a proteção ao meio ambiente não é uma escolha valorativa individual, mas um bem jurídico difuso. A subprocuradora-geral da República registrou que a proteção está prevista na Constituição Federal, em tratados internacionais e na legislação brasileira, devendo ser respeitada independentemente de valorações pessoais. Ela acredita que a atuação estruturada do Ministério Público Federal, do Ministério Público dos estados e de outros órgãos estaduais e federais é essencial para a preservação dos biomas brasileiros.

"A atuação do MP deve considerar um paradigma de responsabilidade ambiental que envolva proteção, equilíbrio e responsabilização", declarou.

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