A comissão de juristas criada para elaborar a proposta de revisão do Código Civil (Lei 10.406/2002) se reuniu nesta segunda-feira (26), no Senado Federal. Durante o evento, o ministro Ricardo Lorenzetti, da Corte Suprema de Justiça da Argentina, e profissionais do meio jurídico debateram e deram sugestões sobre a atualização do Código Civil.
O evento foi conduzido pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Luis Felipe Salomão, presidente da comissão, e contou com a participação de outros membros da corte que integram o grupo de trabalho: Marco Aurélio Bellizze (vice-presidente), João Otávio de Noronha e Isabel Gallotti, além do ministro aposentado Cesar Asfor Rocha. Também participaram o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin e os ministros do STJ Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques, Moura Ribeiro e Paulo Sérgio Domingues.
Bellizze destacou que uma das áreas que mais têm gerado debate na construção da proposta de atualização é o direito de família. "As matérias que causam muito impacto na sociedade, como família e sucessões, são as que têm gerado mais polêmica" – comentou, citando como exemplos os regimes de bens no casamento e a alienação parental, "questões que certamente vão integrar as discussões até a data da votação e depois, no parlamento".
O ministro também explicou que, com o fim dos trabalhos das subcomissões, os relatores-gerais apresentariam, ainda nesta segunda-feira, a versão final da proposta de revisão do código e o parecer sobre as emendas. Após a divulgação desse material, será aberto prazo para emendas e discussão, até o dia 5 de abril. A entrega do anteprojeto ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, está prevista para acontecer no dia 11 de abril.
Em seu discurso, o ministro Ricardo Lorenzetti, da Corte Suprema de Justiça da Argentina, disse que, para que um Código Civil seja compatível com a sociedade do século 21, é necessário construí-lo com base em uma perspectiva principiológica.
"A codificação deve prover os instrumentos para que o Poder Judiciário, os advogados e o povo possam entender como é o sistema jurídico atual. Hoje, o sistema jurídico é formado por vários microssistemas e com leis especiais de todos os tipos, o que dificulta a sua compreensão. Por isso, é importante construir um sistema jurídico baseado em princípios claros", comentou.
O ministro também ressaltou que é importante construir um código que tenha comunicação entre o direito público e o privado. "A codificação atual deve apresentar um sistema que permita coordenar as várias partes, aportar flexibilidade e uma certa comunicabilidade de princípios presentes nos códigos, na constituição e nos tratados internacionais. Por isso, os códigos atuais não são códigos de uma só especialidade", declarou.
A professora Aída Kemelmajer, que foi relatora da comissão de reforma do Código Civil argentino, falou sobre a regulação do direito de família. Segundo ela, é preciso haver, nesse tema, um equilíbrio entre os princípios da igualdade, da solidariedade e da autonomia.
"Por exemplo, quanto à perspectiva de gênero, é necessário seguir falando sobre a igualdade entre homens e mulheres. A perspectiva de gênero não pode legitimar estereótipos de qualquer tipo, mesmo aqueles que empiricamente parecem benéficos para as mulheres", afirmou.
Para o ministro Edson Fachin, a reforma representa uma oportunidade para o país fazer o encontro entre a legislação ordinária e a Constituição Federal e, assim, construir um Código Civil da democracia, da liberdade, da dignidade, da solidariedade e da responsabilidade.
"Os fatos da realidade se impõem. Transformações na sociedade, nas instituições e no Estado, a revolução tecnológica e a imperatividade dos tratados e das convenções internacionais, a prevalência dos direitos humanos e fundamentais, a evolução da doutrina, da legislação e da jurisprudência são indicações de mudanças que se projetam em diversos campos do direito civil", afirmou.
Fachin ainda comentou a importância do diálogo com o ministro da Corte Suprema da Argentina: "A experiência recente da construção de um novo código argentino pode trazer alguns encaminhamentos relevantes, como, por exemplo, na matéria de responsabilidade civil e reparação de danos às vítimas, bem como na reparação de princípios protetivos de direitos humanos e fundamentais que o Código Civil argentino incorporou".
A professora de direito Maria Fernanda Pires, da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG), apresentou algumas propostas do Instituto Brasileiro de Direito Administrativo (IBDA) para aprimorar o regime dos bens públicos no Código Civil. As sugestões de alteração, inclusão ou exclusão de dispositivos no Código Civil podem ser encontradas no site do Senado Federal.