Em julgamento realizado sob o rito dos recursos especiais repetitivos (Tema 975), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou a tese de que é aplicável o prazo decadencial de dez anos, estabelecido no caput do artigo 103 da Lei 8.213/1991, aos pedidos de revisão de benefício previdenciário nas hipóteses em que a questão controvertida não foi apreciada por ocasião do ato administrativo de concessão do benefício.
Com o julgamento, por maioria de votos, o colegiado pacificou entendimentos divergentes nos colegiados de direito público do tribunal e permitiu a solução uniforme de pelo menos 2.700 ações que, de acordo com o Banco Nacional de Demandas Repetitivas do Conselho Nacional de Justiça, estavam suspensas em todo o país, aguardando o precedente qualificado.
Na discussão do tema, o relator do recurso, ministro Herman Benjamin, fez a diferenciação entre os institutos da prescrição e da decadência. Segundo o ministro, a prescrição tem como alvo um direito violado – ou seja, para que ela incida, deve haver controvérsia caracterizada pela resistência manifestada pelo sujeito passivo, sendo essa a essência do princípio da actio nata (o direito de ação nasce com a violação ao direito).
"Por subentender a violação do direito, o regime prescricional admite causas que impedem, suspendem ou interrompem o prazo prescricional, e, assim como já frisado, a ação só nasce ao titular do direito violado", explicou o relator.
Já a decadência, segundo o ministro, tem incidência sobre os direitos exercidos independentemente da manifestação de vontade do sujeito passivo, conhecidos na doutrina como potestativos. Desse modo, para o exercício do direito potestativo e a consequente incidência da decadência – apontou –, não é necessário haver afronta a esse direito ou expressa manifestação do sujeito passivo para configurar resistência.
"Não há falar, portanto, em impedimento, suspensão ou interrupção de prazos decadenciais, salvo por expressa determinação legal (artigo 207 do Código Civil)", afirmou o relator.
De acordo com Herman Benjamin, o direito de revisar o benefício previdenciário, previsto no artigo 103 da Lei 8.213/1991, é qualificado como potestativo, ou seja, o exercício do direito de revisão em âmbito administrativo ou judicial pelo segurado independe da manifestação de vontade do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), sendo suficiente que haja concessão ou indeferimento do benefício.
Por sua natureza potestativa, apontou o ministro, "o direito de pedir a revisão de benefício previdenciário independe de violação específica do fundo de direito (manifestação expressa da autarquia sobre determinado ponto), tanto assim que a revisão ampla do ato de concessão pode ser realizada independentemente de haver expressa análise do INSS. Caso contrário, dever-se-ia impor a extinção do processo sem resolução do mérito por falta de prévio requerimento administrativo do ponto não apreciado pelo INSS".
Nesse sentido, o relator ponderou que, caso fosse a intenção do legislador exigir a expressa negativa do direito reclamado pelo segurado, teria adotado o regime prescricional nesses casos e, assim, o prazo teria início com a aplicação do princípio da actio nata.
"Sob a perspectiva aqui proposta, o regime decadencial impingido ao direito de revisão é muito mais benéfico ao segurado do que é o regime prescricional, pois, além de ter prazo de dez anos – elástico se comparado aos demais prazos do ordenamento jurídico –, pode ser exercido independentemente de a autarquia ter-se oposto expressamente ao ponto objeto de inconformidade", disse o relator.
Ao fixar a tese, entretanto, Herman Benjamin ressalvou a possibilidade futura de o STJ enfrentar controvérsia sobre a repercussão da ação judicial trabalhista na contagem do prazo decadencial descrito no artigo 103 da Lei 8.213/1991. Essa possibilidade, apontou, decorre da hipótese de que o ajuizamento da ação trabalhista que atinja o benefício previdenciário possa ser interpretado como exercício do direito de revisão.
Com a fixação da tese, no caso concreto, a Primeira Seção reformou acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que havia concluído pela não incidência da decadência para a revisão dos benefícios previdenciários prevista no artigo 103 da Lei 8.213/1991, nos casos de questões não resolvidas no processo administrativo.
Acolhendo o recurso do INSS, o colegiado declarou a decadência do direito de revisão do benefício previdenciário.
Leia o acórdão do REsp 1.644.191.